sábado, 30 de agosto de 2008

1995

Como era bom adentrar a sala de aula, olhar em volta e ver pixações sem sentido, riscadas ou grafadas em pincel atômico... Um tipo de arte pouco ortodoxa, mas muito vigorosa e violenta: perfeita para quem estava revoltado com o mundo como se apresentava. Ouvir a música do Papa Winnie era o máximo durante a inda e vinda da aula. Durante uma hora de viajem, o ônibus se tornava uma forma de cama ambulante para os festeiros de final-de-semana. Sempre havia aquela hora para ouvir o radinho e para cantar “You are my sunshine, Yeahh. My only sunshine, right...” e aquilo fazia a noite parecer ter valido a pena.

Sempre tirava uma soneca na bancada antes de começar a aula.O professor era bem camarada, e às vezes tirava a soneca dele também. Tudo em casa.

Sonhava? Nem sonhava em escrever essas linhas. Muito menos nos acontecimentos que me trouxeram até aqui, atrás deste teclado, para juntar pedaços do passado, pensamentos do presente e esperanças para o futuro. Lembrava apenas do dia em que um caminhão havia causado um acidente em frente à escola, que tinha sido feio e que apenas o motorista havia se ferido.

Foi nessa época que eu tomei conhecimento de Porto Alegre, cidade vizinha, capital dos gaúchos. Ela se abriu em minha frente como uma selva de oportunidades e monstros bizarros, escondidos nos cantos escuros da minha malandragem limitada e meu parco conhecimento das ruas. Tive medo e anseio, pavor e curiosidade, terror e revelação durante meses à fio. Descobertas inúmeras fiz naquela época. Conheci pessoas incríveis e tive experiências ruins. Tudo muito bem aproveitado em um módulo cerebral chamado de aprendizado.

Tenho saudades de Porto Alegre. Talvez não da localização da cidade, ou de estar inserido nos limites dela. Sinto falta de estar vagando pelas ruas, sozinho ou com amigos, sem absolutamente nada de importante para fazer. Saudade de descobrir um sebo, um fliperama, uma loja de presentes legal. Saudades de entrar numa tabacaria e comprar um avulso importado por 25 cents. De sentar numa calçada qualquer, comento um morte lenta do centro, curtindo a tarde do vai e vem dos camelôs. De entrar em um fliperama clandestino no coração da cidade, fumar e jogar a tarde toda, gastando o dinheiro do lanche. Entrar na livraria globo, comprar um livro de bolso e ler no ônibus de volta pra casa.

Sem chance, o tempo não volta pra trás. Minha idade não mente e minha barriga denota falta de cuidado pessoal de longa data. Adeus sensação de extrema liberdade desta época. Que venha o desafio de sentir tudo isso de novo, de outra forma.

sábado, 2 de agosto de 2008

Crescer

Desde os 15 anos de idade eu trabalho fora de casa. Estágios, empregos regulares e bicos sometimes, sempre com o intuito de adquirir algo. Objetivos, nem sempre alcançados, traçam o meu perfil profissional. Uma televisão, um DVD... criar um filho, comprar um carro. Sempre corri atrás do que é meu e acreditava inocentemente que isso era crescimento.

Acreditava.

Na realidade, crescer é muito difícil. Nem sequer eu sei ao certo o que isso significa. Dar valor real às coisas, talvez. Saber a hora e o local de agir, acertar mais vezes do que errar. Quem sabe um dia dizer “não” pela primeira vez. Cada pessoa tem o seu momento. Talvez “crescer” seja reconhecer este momento.

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Tenho trabalhado em horários castradores. Do ponto de vista literário e pessoal, sou um deserto de autonomia discutível. Nem ao menos tenho tempo de escrever no meu caderno, quando consigo tira-lo à tempo da pasta. Das idéias sobram poucas linhas, tão vagas quanto discurso eleitoral.

Pois foi justamente aí que reconheci o meu momento. Com a notícia de que meu fim-de-semana seria novamente de trabalho, com um aviso de 2 dias de antecedência, minha mente começou a funcionar de uma maneira diferente. A promessa de um passeio no domingo para a Rafaela, e a impressão inquietante de estar sendo desrespeitado, me levou à sala do gerente com alguns questionamentos. Ele me pediu um tempo para poder conversar, sendo que aguardei no me posto de trabalho por quase 40 minutos. Foram 40 minutos de compaixão de alguns colegas com minha cara de descontente, e o desencorajamento de outros, como se ficar quieto e aceitar fosse uma opção.

Sentado à frente do gerente, depois de 40 minutos de tortura mental, me faziam suar como um boi no brete. Respirei fundo e mandei tudo, de uma só vez, no colo dele.

Não, eu não vomitei, caso seja isto que está pensando. Fui sincero e só isso. Minha mãe, no auge de sua sabedoria, um dia me disse que a verdade é sempre a melhor escolha. Sai da sala com tudo resolvido e com um final-de-semana para curtir com a família. Muitas vezes, é só abrir a boca para conseguir o que se quer.